Após mais de sete horas de debate, a CPMI do 8 de Janeiro aprovou nesta quarta-feira, 18 de outubro, o relatório final da comissão. Com 20 votos a favor, 11 votos contra e nenhum voto de abstenção, os parlamentares ratificaram o parecer da senadora Eliziane Gama (PSD-MA), que solicita o indiciamento de 61 pessoas, incluindo o ex-presidente Jair Bolsonaro. Apesar da forte oposição, que votou contra o texto final, o relatório aprovado será enviado à Procuradoria-Geral da República (PGR), à Polícia Federal e ao Supremo Tribunal Federal (STF) para aprofundar as investigações e apurar as responsabilidades.
Eliziane destacou que o relatório contou com o apoio e a colaboração de uma equipe altamente qualificada, composta por funcionários do Senado, da Câmara, da Polícia Federal, do TCU, da Controladoria-Geral da União, do Banco Central, da Receita Federal e de órgãos de fiscalização e controle. Esses servidores possuem um profundo conhecimento e habilidades técnicas, o que significa que o documento foi o resultado de um esforço coletivo.
Durante as mais de 45 intervenções dos parlamentares na reunião final, tornou-se evidente a divisão entre os apoiadores do governo e a oposição no que diz respeito aos culpados pelos ataques aos palácios dos três Poderes ocorridos em 8 de janeiro, bem como em relação às supostas omissões do governo federal na prevenção da vandalização de prédios públicos. Enquanto os parlamentares da base governista elogiaram o relatório, descrevendo-o como um “documento histórico em defesa da democracia”, os membros da oposição criticaram o relatório, acusando-o de ser tendencioso e argumentando que continha “erros significativos” ao se desviar do escopo definido para a CPMI
“8 de janeiro jamais será esquecido!” declarou o presidente da CPMI, deputado Arthur Maia (União-BA), antes de anunciar o resultado da votação.
Segundo os parlamentares da base governista, o parecer apresenta de maneira detalhada a linha do tempo dos atos preparatórios que antecederam o ataque de 8 de janeiro.
De acordo com o senador Rogério Carvalho (PT-SE), o relatório oferece informações para que as 61 pessoas indiciadas possam ser responsabilizadas por associação criminosa, subversão violenta do Estado democrático de direito e tentativa de golpe de Estado. Ele acredita que as evidências sugerem que houve uma tentativa de minar a democracia por meio do uso do aparato estatal e da influência sobre a ala militar. Assim, o relatório da senadora Eliziane é considerado uma representação precisa dos eventos e uma valiosa contribuição para a história do país.
Pontos de vista contrários ao relatório.
Os membros da oposição expressaram uma forte oposição ao relatório de Eliziane, argumentando que o documento é “desqualificado” e “tendencioso”. Para eles, o relatório falha em reconhecer a possível negligência por parte de membros do governo federal, como o então ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Gonçalves Dias, e o ministro da Justiça, Flávio Dino. Eles afirmaram que, dadas as informações emitidas pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin), a liderança do governo tinha a capacidade de agir e prevenir os ataques ao Palácio do Planalto.
— Esta CPMI foi, sim, dominada pelo governo. Eu duvido que alguém do governo que a solicitou esteja aqui. Eles conseguiram aprovar um relatório, mas a verdade eventualmente prevalecerá. A omissão grave, contínua e intencional, lamentavelmente respaldada pelo relatório, isentando o ex-chefe do GSI e o ministro da Justiça, Flávio Dino, que não cumpriram com suas obrigações, mesmo tendo sido alertados a tempo, isso não será esquecido — lamentou o senador Esperidião Amin.
Liderança militar.
Além de solicitar o indiciamento do ex-presidente, o relatório também lista como indiciados membros militares do governo Bolsonaro próximos a ele, incluindo o ex-ministro da Casa Civil e da Defesa, general Walter Braga Netto, o ex-ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Augusto Heleno, o ex-ministro da Secretaria-Geral da Presidência, general Luiz Eduardo Ramos, e o ex-ajudante de ordens, tenente-coronel Mauro Cid. No total, o relatório pede o indiciamento de oito generais das Forças Armadas.
O senador Sérgio Moro (União-PR) argumenta que o fato de as Forças Armadas não terem demonstrado apoio a uma possível tentativa de golpe antidemocrático sugere que os ataques aos prédios públicos, por si só, não tinham o potencial para efetivar uma tomada do poder. Ele questiona o número de membros das Forças Armadas indiciados e caracteriza o documento como uma espécie de “revanchismo” por parte do governo atual contra os militares:
— No entanto, o relatório propõe o indiciamento de oito generais das Forças Armadas. Claro, as Forças Armadas merecem respeito. Não devem ser consideradas uma instituição intocável, acima da lei, mas, para justificar o indiciamento de generais de alto escalão e almirantes das Forças Armadas, é necessário dispor de evidências concretas. O que o relatório, em essência, apresenta? “Que houve conversas; que houve registros; que houve considerações; que, em mensagens de aplicativos como o WhatsApp, algumas pessoas mencionaram a possibilidade de um golpe de Estado.” Mas, houve alguma ação real, algum movimento efetivo por parte dos generais que estão sujeitos ao indiciamento? Houve alguma mobilização das Forças Armadas em direção a um golpe de Estado? Não houve. E o relatório não fornece qualquer prova concreta nesse sentido.
Relatório embasado.
Por outro lado, a senadora Eliziane Gama enfatizou que a tentativa de descreditar e diminuir a importância do relatório é infrutífera e demonstra que a oposição não conseguiu sustentar os próprios argumentos que haviam levantado.
— Nenhum dos indiciamentos desta comissão foi feito sem uma investigação meticulosa respaldada por provas concretas. Isso inclui a análise minuciosa de informações e dados, bem como a quebra de sigilos bancários, telefônicos, telemáticos, fiscais e relatórios de inteligência financeira (RIFs). Li cada palavra e cada ponto deste relatório, que foi elaborado com a contribuição de uma equipe altamente qualificada e experiente.
A relatora também salientou que, de acordo com o quadro legal atual, a ativação da Força Nacional para intervir no conflito em torno do Palácio do Planalto requer autorização do governo estadual, o que não ocorreu naquela ocasião.
O senador Randolfe Rodrigues reconheceu o relatório como um documento juridicamente sólido, baseado em fatos concretos, que desmente o que ele descreveu como a tese negacionista e fantasiosa apresentada pela oposição.
— O relatório da senhora excelência efetivamente põe um fim à tese negacionista. Não toleramos negacionismo nesta comissão, nem na sociedade. A última vez que a sociedade tolerou o negacionismo, no contexto científico, resultou na morte de mais de 700 mil compatriotas. Portanto, não podemos aceitar o negacionismo em relação ao 8 de janeiro e aos eventos que o precederam, incluindo teses fantasiosas que sugerem que o nosso governo estava tramando um autogolpe contra si próprio.
Jair Bolsonaro
Os opositores questionaram a lógica de o relatório considerar o depoimento do hacker Walter Delgatti como evidência para solicitar o indiciamento do ex-presidente Jair Bolsonaro. A senadora Damares Alves (Republicanos-DF) destacou que Delgatti já havia sido condenado pela justiça e, portanto, não deveria ser usado como fonte de provas para qualquer indiciamento. Ela acredita que o relatório de Eliziane não terá sucesso nos órgãos apropriados.
— Bolsonaro não ocupava a presidência da República no dia 8 de janeiro, não existem imagens de Bolsonaro destruindo os prédios, não há evidências de DNA, nem perícias que comprovem que Bolsonaro tenha estado no interior daqueles edifícios causando danos. Esta CPMI foi estabelecida para investigar os eventos de 8 de janeiro. Bolsonaro não possui qualquer ligação com esses acontecimentos, mas o ex-presidente Lula sim. Ele era o superior hierárquico do ministro do GSI. Portanto, se houver um presidente responsável pelos eventos de 8 de janeiro, é o presidente Lula.
FONTE: AGÊNCIA SENADO