AGU vai ao STF: O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF) por meio da Advocacia-Geral da União (AGU) para tentar reverter uma decisão do Congresso Nacional que derrubou a cobrança do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) em determinadas transações de crédito. A medida, vista pelo Planalto como uma ameaça à estabilidade fiscal e ao cumprimento das metas orçamentárias de 2025, acendeu um novo alerta nas relações entre Executivo e Legislativo.
O movimento revela a crescente tensão entre o Palácio do Planalto e o Congresso, especialmente o Senado, onde o governo sofreu derrotas recentes. Ao acionar o STF, a AGU argumenta que a revogação do IOF compromete o planejamento fiscal e fere dispositivos constitucionais. Mas afinal, o que está em jogo com a suspensão desse imposto, e por que a reação do governo foi tão imediata?
O que é o IOF e por que ele é importante para o governo?
O IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) incide sobre operações de crédito, câmbio, seguro e títulos ou valores mobiliários. No caso em questão, trata-se da alíquota aplicada sobre operações de crédito — como empréstimos pessoais e financiamentos — que foi zerada pelo Congresso Nacional em uma sessão de derrubada de vetos.
Para o governo federal, o IOF é uma importante fonte de arrecadação. Estima-se que, apenas em 2025, a manutenção do imposto garantiria mais de R$ 20 bilhões aos cofres públicos. Esse valor já estava previsto na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e seria essencial para o cumprimento da meta de déficit primário zero — uma das promessas do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, para garantir a credibilidade do país perante o mercado e organismos internacionais.
A reação do Congresso: derrota estratégica do Planalto
O Congresso Nacional, ao derrubar o veto presidencial que mantinha a cobrança do IOF, agiu com apoio expressivo da base centrada no Senado. Parlamentares argumentaram que a manutenção da cobrança do IOF penaliza diretamente a população de baixa e média renda, que recorre a operações de crédito no varejo, especialmente em momentos de aperto financeiro.
Além disso, líderes do Centrão alegaram que o imposto tem caráter regressivo e defasado, sendo mantido por sucessivos governos sem uma discussão mais profunda sobre sua finalidade e real efetividade na economia. A decisão foi vista como uma forma de pressionar o governo em meio às negociações por emendas e cargos no segundo semestre legislativo.
AGU no STF: argumentos jurídicos e riscos institucionais
A AGU protocolou a ação no Supremo com base no argumento de que a decisão do Congresso Nacional interfere na execução orçamentária previamente aprovada e compromete o equilíbrio fiscal do país. O órgão sustenta que o fim do IOF nas operações de crédito sem uma fonte alternativa de compensação fiscal desrespeita o artigo 113 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, que exige que qualquer renúncia de receita seja acompanhada de estimativa de impacto e medidas compensatórias.
Outro ponto levantado pela AGU é que a revogação do IOF desorganiza o planejamento tributário do governo federal e pode comprometer programas sociais e investimentos públicos que dependem da arrecadação prevista. A ação pede a suspensão imediata dos efeitos da decisão do Congresso até o julgamento do mérito pelo plenário do STF.
Impactos para o Congresso Nacional: autonomia em xeque?
A ida da AGU ao Supremo foi recebida com críticas por parte de líderes do Congresso. Muitos parlamentares interpretaram a medida como uma tentativa do Executivo de judicializar uma decisão legítima do Legislativo, reacendendo o debate sobre a independência entre os poderes.
Senadores e deputados alertaram que a movimentação do Planalto pode agravar ainda mais a tensão institucional, principalmente em um momento em que o governo precisa recompor apoio para aprovar pautas prioritárias como a reforma tributária complementar e o novo arcabouço fiscal. O presidente da Câmara, Arthur Lira, evitou declarações contundentes, mas interlocutores indicam que ele considera a ação da AGU uma “afronta” ao Congresso.
O que está em jogo para o governo federal
O governo Lula aposta no rigor fiscal como um dos pilares centrais de sua estratégia econômica. A permanência do IOF é parte desse plano. Perder essa fonte de arrecadação significaria revisar metas fiscais ou buscar novas formas de compensação — algo politicamente custoso em um Congresso fragmentado e em ano pré-eleitoral.
Além do impacto financeiro direto, a derrota no Senado e o impasse no STF revelam a dificuldade de articulação política do governo com sua base. Apesar dos esforços de Lula em ampliar a aliança com partidos do centro, episódios como este colocam em dúvida a real capacidade de sustentação do Executivo nas votações mais sensíveis.
Conclusão: uma crise fiscal, política e institucional
A disputa sobre o IOF é mais do que um embate técnico sobre impostos. Trata-se de um capítulo importante da dinâmica entre Executivo, Legislativo e Judiciário no Brasil atual. O governo Lula, ao acionar o STF por meio da AGU, assume uma postura de enfrentamento institucional para garantir a estabilidade de sua política fiscal. Por outro lado, o Congresso reage em defesa de sua prerrogativa legislativa, o que pode aprofundar a crise política.
Nos próximos dias, o Supremo Tribunal Federal terá papel central na definição dos rumos desse impasse. Qualquer decisão poderá ter reflexos imediatos não apenas nas contas públicas, mas na governabilidade e nas relações entre os poderes. Em um ambiente político marcado por incertezas, a questão do IOF torna-se um termômetro da estabilidade democrática e fiscal do país.